A FARRA DAS ANILHAS!!

17/09/2011 23:52

Anilhas adquiridas e distribuídas pelo IBAMA facilitam o tráfico de pássaros silvestres. Para que uma ave seja identificada como produto de reprodução controlada em ambiente doméstico, há necessidade de que apresente em sua perna um anel com diâmetro interno ligeiramente maior que o do seu metatarso. Esse anel, conhecido como anilha, é um cilindro metálico com diâmetro interno específico para cada espécie, em acordo com o seu porte físico. Nele estão várias inscrições que enunciam a sua origem, um número de série e o ano de nascimento. As anilhas somente podem ser colocadas nos pássaros até o quinto ou sexto dia de vida, ainda no ninho. Depois disso o seu pé crescerá e a anilha não mais poderá ser retirada.

Os mais de trezentos mil criadores amadoristas que são registrados no IBAMA e possuem autorização para manter e reproduzir pássaros de nossa fauna nativa, adquirem essas anilhas diretamente do setor de fauna da Autarquia, sendo-lhes vetado o uso de quaisquer outras que não as de distribuição oficial.

 

As anilhas oficiais são adquiridas pelo IBAMA de fabricantes nacionais por meio de licitações públicas. Essas anilhas podem ser fabricadas em alumínio  ou aço inoxidável, segundo o interesse do comprador.

 

O IBAMA tradicionalmente adquire e repassa aos criadores, anilhas confeccionadas em liga de alumínio. Essas anilhas, pela flexibilidade do alumínio, podem ser adulteradas, pelos traficantes de pássaros, com grande facilidade. Uma prensa alargadora aumenta o diâmetro das anilhas de forma a que possam ser colocadas em pássaros adultos, capturados na natureza. Um alicate especialmente adaptado devolve a anilha ao seu diâmetro original, após ser inserida no pássaro. Dessa forma um traficante coleta um pássaro na natureza e o identifica como se tivesse nascido em cativeiro. Não há forma de se ter absoluta certeza da origem legal de um pássaro identificado com anilhas de alumínio.

Ferramentas usadas na adulteração das anilhas de alumínio

 

As anilhas confeccionadas em aço inoxidável não permitem adulteração. Vários criadores, biólogos, veterinários e ambientalistas já fizeram solicitações ao IBAMA para que não sejam mais adquiridas as anilhas de alumínio e sim de aço inoxidável. O IBAMA já fez várias apreensões de ferramentas empregadas na adulteração de anilhas.

 

Em entrevista do então Diretor de Uso Sustentável da Biodiversidade, Dr Antônio Carlos Hummel, concedida em maio de 2008 ao site OLA (https://www.olaonline.org.br) fica claro o conhecimento do problema causado pela fragilidade das anilhas distribuídas pelo IBAMA, passiveis de serem adulteradas por traficantes.  Mas as providências nunca foram tomadas.

 

Espécies como o trinca-ferro-verdadeiro (saltador similis), muito valorizadas no mercado de pássaros, e com limitada reprodução em ambiente doméstico, são capturadas aos milhares e mantidas em cativeiro até que sejam identificados os melhores exemplares, com o canto mais adequado a disputa de torneios. Esses são identificados com anilhas de alumínio distribuídas aos criadores pelo IBAMA, da forma anteriormente descrita, e comercializados como se tivessem origem legal. Ouvimos falar de casos onde os que foram reprovados ne ssa seleção foram sacrificados, para evitar que fossem recapturados no futuro. São as anilhas de alumínio a serviço do tráfico.

 

Para impedir a adulteração de anilhas, basta que sejam adquiridas pelo IBAMA as anilhas fabricadas em aço inoxidável, do mesmo tipo empregado nos criatórios comerciais. As anilhas de aço inoxidável podem ser adquiridas diretamente das empresas fabricantes por valor semelhante ao cobrado atualmente pelo IBAMA dos criadores amadoristas que solicitam anilhas oficiais. A aquisição de anilhas fabricadas em aço inoxidável e a sua distribuição aos criadores amadoristas sem qualquer alteração na rotina estabelecida pelas portarias que regulam a atividade, não implicará em nenhum ônus para o erário e contribuirá para preservar os pássaros de vida livre.

 

O Distrito Federal sofre especialmente com esse descaso do IBAMA pois o Trinca-Ferro-Verdadeiro é um pássaro típico da região e vem escasseando na natureza por conta da captura ilegal. Se o IBAMA não mudar o material das anilhas que licita e distribui aos criadores, em poucos anos a espécie estará extinta na região. O curió (oryzoborus angolensis) e, especialmente o Bicudo (oryzoborus maximiliani) já foram abundantes no Distrito Federal e hoje já estão extintos. Não podemos perder mais uma espécie por conta de uma falta de atenção do setor de fauna do IBAMA.

 

Para surpresa e desagrado dos criadores e, naturalmente, para a satisfação dos traficantes de pássaros, o IBAMA publicou o resultado do pregão eletrônico nº 34/2010, garantindo novamente a compra de anilhas de alumínio da empresa CAPRI. Essa licitação, justificada pelo diretor de fauna da Autarquia, após a reclamação dos criadores, como um compra de caráter emergencial, apenas para atender uma demanda represada pelo atraso na distribuição das anilhas, mostra-se totalmente absurda. Em primeiro lugar o contrato acorda o fornecimento de mais de um milhão de anilhas, garantindo o provimento até  31 de dezembro de 2011, o que obviamente não se trata de uma compra emergencia l. Em segundo lugar, causando maior surpresa, foram adquiridas 325 mil anilhas de alumínio com diâmetro 3.5 mm, usadas para a identificação do trinca-ferro-verdadeiro, a espécie mais capturada na natureza atualmente e pouco reproduzida em cativeiro. Essa quantidade de anilhas se fosse de aço inoxidável, seria empregada apenas em filhotes nascidos em cativeiro e atenderia a demanda de muitos anos de criação. Enquanto isso foram adquiridas apenas 50 mil com diâmetro 3.0 mm, usadas para identificar bicudos, uma espécie facilmente reproduzida em cativeiro e praticamente extinta na natureza.

 

Não há fundamentação técnica para a aquisição de 325.000 anilhas 3.5 enquanto se adquire apenas 50.000 anilhas 3.0. Para maior clareza transcrevo o aviso de registro de preços publicado pelo IBAMA na primeira semana de janeiro de 2011, que comprova esse absurdo. Ainda é possível observar nesse registro de preços uma inexplicável majoração do valor que o IBAMA paga pelas anilhas em relação ao seu valor de mercado.

 

Enquanto a mesma empresa comercializa uma anilha 2.8 mm por R$ 1,75, o IBAMA paga por ela R$ 3,89 em um pregão  para a compra de mais de 1 milhão de unidades. Anilhas de 4 mm rescentemente adquiridas por R$ 1,70 da mesma empresa, são adquiridas pelo IBAMA por R$ 3,95. A mesma diferença de preços pode ser observada em todos os itens do registro de preços. Se essa diferença de preços não configura superfaturamento é, no mínimo, um péssimo negócio feito com dinheiro público. Temos esperança de que um dia o Ministério Público se interesse por essa farra das anilhas.